11 fevereiro 2008

A ditadura da pedagogia

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Reconhecer a necessidade de uma teoria do aprendizado não implica esquecer que o propósito primeiro deste processo é aprender. No Brasil, contudo, esta atividade-meio (a pedagogia) – o estudo do processo do aprendizado, uma forma de ajudar o professor a ensinar melhor – substituiu a atividade-fim do ensino, que é o aprendizado. O ensino está nas mãos dos pedagogos, não dos professores.

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Na prática, a entrega do sistema educacional aos pedagogos, como qualquer substituição de uma atividade-fim por uma atividade-meio, leva à decadência da atividade-fim. Imaginemos que, em um surto de loucura, o mesmo ocorresse em outra área. Bom, para que uma fábrica de automóveis funcione, é preciso que ela tenha um serviço de limpeza eficiente. Os faxineiros têm que saber, por exemplo, que não podem aspergir desengraxante nas engrenagens de uma máquina, que há peças pequenas que não podem ser jogadas fora etc. Sem um bom serviço de limpeza, a fábrica acaba parando.

Do mesmo modo, sem que se tenha uma noção real de como se aprende, um professor não tem como ensinar; lembro-me de um professor que tive, que passava as aulas recitando um caderno com o texto que ele havia escrito. Na prova, cobrava apenas que completássemos as lacunas. Lacunas aleatórias, a completar de modo preciso: quem escrevesse “mas” no lugar de “porém” errava a questão; só passava quem decorasse inteirinho o tal caderno. Este sujeito precisaria de noções de pedagogia real.

Mas e se a fábrica decidisse que os faxineiros, com sua atividade-meio, coordenassem tudo, em detrimento da atividade-fim de produção? E se os faxineiros, com suas prioridades e interesses, fossem os gerentes da fábrica? Não sairia um só automóvel da linha de montagem, mas a fábrica estaria sempre limpinha, brilhante mesmo... Pois bem, pedagogos dirigindo o ensino são como faxineiros tomando conta da fábrica de automóveis: ninguém aprende nada, mas que auto-estima têm os alunos!

Ao cabo dos 12 ou 13 anos que passam nos bancos escolares, a regra é os alunos saírem analfabetos funcionais, mas com uma auto-estima grande o suficiente para acharem que merecem prêmios por simplesmente existir e um compromisso pessoal com uma “mudança de paradigma” – não que saibam qual era o anterior, ou sequer o que venha a ser um paradigma, mas aí já seria querer demais, não é mesmo? Aprender palavras difíceis já pareceria demais com o temido ensino tradicional..."
Carlos Ramalhete, na Gazeta do Povo de 11/02/2008.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sou formado em pedagogia...e dou os parabéns ao autor Carlos Ramalhete, é mais ou menos isso que acontece com a maioria dos pedagogos(as) das nossas escolas principalmente da rede publica municipal de Curitiba..."passam as mãos" nas cabeças das cças... e a auto-estima vai lá em cima...e a educação cada vez mais "pro brejo"...além dessa "adulação"...tem outra coisa interessante que é a de ser BOMBEIRO DA ESCOLA..VIVE APAGANDO FOGO DAS INTRIGAS DE PROFESSORES... BRIGAS
DOS ALUNOS...RECEBE MUITO BEM OS PAIS (AQUELES QUE SOMENTE APARECEM NAS ESCOLAS PARA RECLAMAR...)..PEDEM "CADERNINHOS" PARA AS PROFESSORAS ( AQUELES QUE SOMOS OBRIGADOS A FAZER - COMO SE AQUILO QUE ESTÁ ESCRITO , É O QUE REALMENTE PASSAMOS PARA OS ALUNOS!)...E PARA PIORAR...SERVEM MUITO PARA PERSEGUIREM PROFESSORAS NAS AVALIAÇÕES DO "FAMIGERADO ESTÁGIO PROBATÓRIO"..AFINAL: QUAL É MESMA A FUNÇÃO DE UM (A) PEDAGOGO (A) EM UMA ESCOLA! pARABÉNS CARLOS RAMALHETE por dar a oportunidade de refletirmos sobre nossas funções.... Prof. Dimas Mello Braga