04 outubro 2008

Tempo perdido

Mas quando se viram sozinhos na casa sucumbiram no lírio dos amores atrasados. Era uma paixão insensata, alucinada, que fazia tremerem de pavor na cova os ossos de Fernanda e os mantinha num estado de excitação perpétua. Os gemidos de Amaranta Úrsula, as suas canções agônicas, estavam do mesmo jeito às duas da tarde na mesa da sala de estar e às duas da madrugada na despensa. “O que mais me aborrece”, ria, “é o tempo enorme que perdemos.” No aturdimento da paixão, viu as formigas devastando o jardim, saciando a sua fome pré-histórica nas madeiras da casa, e viu a torrente de lava viva se apoderando outra vez da varanda, só se preocupou em combatê-la quando a encontrou no quarto. Aureliano abandonou os pergaminhos, não tornou a sair de casa, e respondia de qualquer maneira às cartas sábio catalão. Perderam o sentido da realidade, a noção tempo, o ritmo dos hábitos cotidianos. Tornaram a fechar portas e janelas para não demorarem nos trâmites de desnudamento, e andavam pela casa como Remedios, a bela, sempre quis estar, e se espojavam em pêlo nos barreiros do quintal, e uma tarde por pouco não se afogaram quando se amavam na caixa-d’água. Em pouco tempo fizeram mais que as formigas ruivas: quebraram os móveis da sala, rasgaram com as suas loucuras a rede que resistira aos tristes amores de acampamento do Coronel Aureliano Buendía e abriram os colchões e os esvaziaram no chão, para se sufocar em tempestades de algodão. Embora Aureliano fosse um amante tão feroz como o seu rival, era Amaranta Úrsula quem comandava com o seu engenho disparatado e a sua voracidade lírica aquele paraíso de desastres, como se tivesse concentrado no amor a indomável energia que a tataravó consagrara à fabricação de animaizinhos de caramelo. Além disso, enquanto ela cantava de alegria e morria de rir das suas próprias invenções, Aureliano ia se tornando mais absorto e calado, porque a sua paixão era ensimesmada e calcinante. Entretanto, ambos chegaram a tais extremos de virtuosismo que quando se esgotavam na exaltação tiravam melhor partido do cansaço. Entregaram-se à idolatria dos corpos, ao descobrir que os tédios do amor tinham possibilidades inexploradas, muito mais ricas que as do desejo.

Gabriel Garcia Márquez - Cien Años de Soledad

Nenhum comentário: