28 abril 2008

O Homem Moderno

"Assistimos hoje ao fim de uma civilização, e podemos dizer que ela se encerra com a queda em bloco dos sistemas totalitários nos países do Leste Europeu, embora ainda existam redutos a serem desmantelados nessa mesma linha política e ideológica e se anunciem novas prisões para o homem, com outra roupagem e faces bem diversas.
Assim como nos último anos entraram em moda certos produtos light - o cigarro, algumas bebidas ou certos alimentos - também foi sendo gerado um tipo de homem que poderia ser qualificado de homem light.
Qual é seu perfil psicológico? Como poderia ser definido? Trata-se de um homem relativamente bem-informado, mas de escassa educação humanista, muito voltado ao pragmatismo, por um lado, e a vários assuntos, por outro. Tudo lhe interessa, mas de forma superficial, não é capaz de fazer uma síntese daquilo que percebe e, como conseqüência, se converte numa pessoa trivial, superficial, frívola, que aceita tudo, mas que carece de critérios sólidos em sua conduta. Tudo nele se torna etéreo, leve, volátil, banal, permissivo.
Viu tantas mudanças, tão rápidas e em tempo tão curto, que começa a não saber a que se agarrar ou, o que dá no mesmo, a fazer afirmações do tipo 'vale tudo', 'não me interessa' ou 'as coisas mudaram'. E assim encontramos um bom profissional em seu campo específico de trabalho, que conhece bem a tarefa que tem nas mãos, mas que fora desse contexto fica à deriva, sem idéias claras, preso - como está - num mundo cheio de informação, que o distrai, mas que pouco a pouco o converte num homem superficial, indiferente, permissivo, que vive um enorme vazio moral.
As conquistas técnicas e científicas - impensáveis há poucos anos - nos propiciaram avanços evidentes: a revolução da informática, os progressos da ciência em seus diversos aspectos, uma ordem social mais justa e perfeita, uma preocupação mais firme com os direitos humanos, a democratização de tantos países e, agora, a ruína em bloco do comunismo. Mas, diante de tudo isso, devemos colocar em discussão aspectos da realidade que funcionam mal e que mostram a outra face da moeda: a) materialismo: faz com que um indivíduo obtenha certo reconhecimento social pelo simples fato de ganhar muito dinheiro; b) hedonismo: viver bem a qualquer custo é o novo código de comportamento, o que significa a morte dos ideais, a ausência de sentido e a busca de uma série de sensações cada vez mais novas e passageiras; c) permissividade: arrasa os melhores propósitos e ideais; d) revolução sem finalidade nem projeto: a ética permissiva substitui a moral, o que engendra um desconcerto generalizado; e) relativismo: tudo é relativo, o que leva a cair na absolutização do relativo; brotam, assim, alguma regras presididas pela subjetividade; f) consumismo: representa a fórmula pós-moderna da liberdade.
Assim, as grandes transformações sofridas pela sociedade nos últimos anos são, a princípio, contempladas com surpresa, depois com progressiva indiferença ou, em outros casos, como a necessidade de aceitar o inevitável. A nova epidemia de crises e rupturas conjugais, o drama das drogas, a marginalização de tantos jovens, as greves dos trabalhadores e outros fatos da vida cotidiana, tudo isso prontamente se admite como algo que está aqui e contra o qual não se pode fazer nada.
Dos meandros dessa realidade sociocultural vai surgindo o novo homem moderno, produto de seu tempo. Se observarmos melhor, veremos que esse homem tem os seguintes componentes: pensamento fraco, convicções sem firmeza, assepsia em seus compromissos, indiferença sui generis feita de curiosidade e relativismo ao mesmo tempo... sua ideologia é o pragmatismo, sua norma de conduta, a vigência social - que vantagens leva, o que está na moda; sua ética se fundamenta na estatística, substituta da consciência; sua moral repleta de neutralidade, carente de compromisso e subjetividade, fica relegada à intimidade, sem se atrever a sair em público."

Texto extraído do livro 'O Homem Moderno: a luta contra o vazio', de Enrique Rojas.

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