19 junho 2007

Outro jornalismo é possível

"Publicado em 23 idiomas e em 34 países, o Le Monde Diplomatique inaugura, (...). As mudanças são parte de um projeto necessário: lançar, no início de 2007, um Caderno Brasil, com textos produzidos no país, por uma rede de colaboradores que ofereça um novo ponto de vista também sobre os problemas nacionais; fazê-lo de modo participativo, com base na mobilização de pessoas e instituições da sociedade civil.

Tais objetivos se entrelaçam, é claro, com a idéia de que outro país, e outro mundo, são possíveis. Lançado em 1954, na França, o Le Monde Diplomatique transformou-se, ao longo do tempo, em referência de jornalismo crítico e profundo. Mas esta identidade foi reforçada – e, num certo sentido, reinventada – a partir da década de 1990, graças à postura marcante que o jornal adotou diante da globalização. Enquanto a imprensa, cada vez mais associada ao poder econômico e domesticada, procurava convencer as sociedades de que se tratava de um processo natural e inevitável, Le Monde Diplomatique dedicou-se, quase solitariamente, a examiná-lo.

Ao lado da nova cidadania planetária...

No jornal, o fenômeno foi desnaturalizado: vista a partir de muitos ângulos, a globalização perdia sua aura de algo espontâneo ou neutro: de “sinal dos novos tempos”... Nossas investigações deixavam claro que ela havia sido desencadeada a partir de decisões políticas muito concretas (por exemplo, a desregulamentação dos mercados financeiros). Demonstravam, além disso, que atendia aos interesses de alguns grupos sociais muito minoritários (ao promover uma reconcentração maciça de riquezas, em escala planetária). Revelavam que suas conseqüências estendiam-se por múltiplos aspectos da vida humana (multiplicando a velocidade do aquecimento da atmosfera terrestre ou do desaparecimento de idiomas).

Ainda mais importante: se a globalização era fruto de decisões políticas, outras decisões, de sentido oposto, poderiam interromper ou inverter tendências. Le Monde Diplomatique envolveu-se, no plano intelectual, em todas as campanhas que marcaram a emergência da sociedade civil planetária. Em 1997, ao descrever as conseqüências sociais dramáticas das crises financeiras asiáticas, propôs, como antídoto, a mobilização internacional dos cidadãos contra a ditadura dos mercados – num texto que viria a estimular a fundação do movimento ATTAC. Em 1998, seus artigos sobre do Acordo Multilateral sobre Investimentos (AMI) estimularam uma resposta mundial que evitou um novo ataque aos direitos sociais e ao ambiente. Em 1999, apontou os riscos de mais uma rodada de “liberalização” do comércio promovida pela OMC; e viu nos protestos de Seattle (EUA), que desfizeram a ameaça, como sinal da “emergência de um contra-poder mundial”. Em 2000, a redação do jornal foi o local onde um grupo de brasileiros apresentou, pela primeira vez, a idéia de organização de um Fórum Social Mundial.

Le Monde Diplomatique só pode desempenhar um papel tão destacado na construção de uma cidadania planetária porque sempre recusou a condição de panfleto. Num mundo em que se proclama a inexistência de alternativas – e se procura, portanto, reduzir dos cidadãos a espectadores da História –, nada mais transformador que valorizar e construir, na prática, o direito à informação, à comunicação, ao exercício de enxergar o mundo e influir em seus destinos."

Fonte: Le Monde Diplomatique

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