11 março 2009

Entre teias e tramas

"Teu corpo me machuca, quis dizer. Quis dizer que tua procura me enternece. Que quando te abraço, o que seguro firme com os dedos é o desejo de ser desejo teu. Quis contar como as paredes se dobram quando não estás. Que faço quarentenas de ti e que te espero. Mas, no lugar da fala, teço mantilhas para aquecer teu corpo ausente. Faço do cabelo uma trança, concebendo outros nós. As aranhas me acompanham no trabalho de tecer. Vivo entre teias e tramas, aumentando esses contatos da coisa com a coisa mesma. Mas o acúmulo de solidão também é aspereza e é quando vens que posso descansar de mim mesma e dos nós. Chegas com olhos banhados de umas águas antigas, em silêncio, procurando um conforto qualquer que te deixe quieto. Vens para te esvaziar. Enquanto te espero para iluminar a casa, dar corpo ao tecido, soltar o cabelo, ficar completa. Vens buscar brandura do contato ameno, enquanto eu inteira anseio pelos arranhões e os aprisionamentos breves do atrito. Quis te dizer qualquer coisa que aliviasse a minha angustia, qualquer coisa que atrasasse tua partida. Quis encontrar alguma fala, para dar um sentido talvez bonito, talvez suave, de me ver tão sôfrega de nós e atritos ao lado de ti, sempre tão ameno e grato de teus contatos com o nada."

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