11 setembro 2010

Ciência X Religião


Estamos condenados ao desentendimento se a única coisa que nos une é a constatação óbvia de que não há motivos para acreditar em Deus ou deuses. Ateísmo é uma conclusão pequena sobre um assunto que só é grande nas pequenas mentes.

Se nos unirmos porque vemos na ciência a melhor forma de obter conhecimento confiável e funcional sobre o mundo, se nos unirmos pela crença nos direitos universais de todos os seres humanos, se nos unirmos pelos ideais dos iluministas e enciclopedistas, se nos unirmos na vontade de tornar este mundo melhor por vias pacíficas e democráticas que abominam a morte, então não somos apenas ateus e agnósticos, somos também humanistas seculares.

E o humanismo secular já é, em alguns aspectos, um movimento bem-sucedido. Já existe uma organização internacional com mais de 50 anos, a IHEU, que é uma das poucas com coragem para denunciar a tentativa dos países da Organização da Conferência Islâmica (OIC), que todos os anos tentam passar uma resolução contra a blasfêmia na ONU. Hoje, 11 de setembro, é um dia especialmente adequado para lembrar que proibir a “blasfêmia” não vai evitar a perpetuação da barbárie no mundo.

A LiHS (Liga Humanista Secular do Brasil) se inspira em organizações como a IHEU, como a BHA (British Humanist Association) e o Council for Secular Humanism.

Dawkins está certo em falar que juntar ateus é como arrebanhar gatos. Mas isso diz respeito a juntar ateus apenas por seu ateísmo.

Existem vários tipos de condutas em ateus. Não deveria surpreender a nenhum ateu que existam ateus agindo mal, porque o ateísmo é vazio em proposições quanto à conduta, justamente por não ser uma posição sobre conduta, mas sobre o que existe no mundo real. Muitos ateus como eu (talvez a maioria) compartilham valores na conduta intelectual – que é orientada pela ciência e pela filosofia – e na conduta moral, orientada pela universalidade de direitos enraizada na reciprocidade, no diálogo, e na empatia.

Estas condutas já receberam vários nomes e um deles é humanismo secular.

Não há promessas mirabolantes: um humanista secular não vai se tornar perfeito. Tanto quanto a ciência, que chega a respostas confiáveis por uma comunidade, o trabalho de elevar o status moral do mundo deve ser um trabalho não individual, mas coletivo, porém, não pode perder de vista que as raízes dos direitos universais são as capacidades e necessidades dos indivíduos. Por isso, culturas não valem mais que indivíduos. Se culturas não respeitam os indivíduos de alguma forma, devem mudar, e de fato mudam quando há um trabalho coletivo pela mudança.

E não me furto a dizer quais são algumas dessas culturas: é a nossa cultura, quando nega o direito civil ao casamento para homossexuais; é a cultura dos índios Suruwahá e outros, que praticam o infanticídio; é a cultura islâmica que obedece à lei da Sharia; é a cultura daquelas corporações que remuneram mal seus funcionários e trabalham pela via do “homem é o lobo do homem”.

Quem conhece o suficiente de ciência, de arte e de cultura sabe que indivíduos perfeitamente sábios simplesmente não existem. Sempre haverá perguntas sem respostas para qualquer Einstein, Jesus, Confúcio, ou Buda. Nenhuma parábola de Jesus, por exemplo, responde a problemas reais sobre o mundo que nos cerca – respostas bonitas não são respostas práticas.

Ficar fazendo discursos morais bonitos não ajuda ninguém a descobrir a penicilina, nem a investigar em que estágio um embrião humano pode ser considerado um ser que percebe a si mesmo (um indivíduo). Para ter respostas sobre o mundo, tiramos nossas pré-concepções e livros sagrados da frente dos olhos, olhamos em volta e arregaçamos as mangas para chegar a respostas difíceis de serem obtidas.

Obter respostas é tão difícil quanto construir um prédio – não é trabalho para um indivíduo. É trabalho para comunidades orquestradas em torno de uma meta comum.

Se os ateus querem fazer mais do que criticar, polemizar e desconstruir, precisam se unir em torno de uma meta comum.

Eu, um indivíduo, na minha ignorância e na minha esperança, escolhi o humanismo secular e a ciência. E você?
Eli Vieira, presidente da LHSB -Liga Humanista Secular do Brasil

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