11 setembro 2008

O tempo escapa pelas mãos

"'Os anos de agora já não vêm como os de antigamente', costumava dizer [Ursula], sentindo que a realidade cotidiana lhe escapava das mãos. Antigamente, pensava, as crianças demoravam muito para crescer. Bastava recordar todo o tempo que fora necessário para que José Arcadio, o mais velho, partisse com os ciganos e tudo o que acontecera até que ele voltasse pintado como uma cobra e falando como um astrônomo, e as coisas que tinham acontecido em casa até que Amaranta e Arcadio esquecessem a língua dos índios e aprendessem o castelhano. Que se visse o sol e o sereno que suportara o pobre José Arcadio Buendía debaixo do castanheiro, e o quanto tivera que chorar a sua morte antes que lhe trouxessem moribundo um Coronel Aureliano Buendía que, depois de tanta guerra e depois de tanto se sofrer por ele, ainda não tinha feito cinqüenta anos. Em outra época, depois de passar o dia inteiro fazendo animaizinhos de caramelo, ainda lhe sobrava tempo para se ocupar das crianças, para ver-lhes no branco dos olhos que estavam precisando de uma poção de óleo de rícino. Agora, pelo contrário, quando já não tinha nada que fazer e andava com José Arcadio pregado às saias de manhã à noite, a qualidade ruim do tempo obrigava-a a deixar as coisas pela metade."

Gabriel Garcia Márquez - Cien Años de Soledad

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