Mas nem sempre foi assim. Há meio século, experimentos realizados na Universidade de Michigan mostraram que as planárias, vermes aquáticos passíveis de condicionamento clássico, eram capazes de adquirir, mesmo sem treinamento, associações estímulo-resposta por ingestão de um extrato de planárias previamente condicionadas (McConnell, J Neuropsychiat, 3: 542-548, 1962). O resultado, aparentemente revolucionário, sugeria que os substratos materiais da memória são moléculas. Contudo, estudos posteriores demonstraram que a ingestão de planárias não-condicionadas também acelerava o aprendizado, revelando um efeito hormonal genérico, independente do conteúdo das memórias presentes nas planárias ingeridas (Hartry et al., Science, 146: 274-275, 1964).A ingestão de memórias é impossível porque elas são estados complexos de redes neuronais, não um quantum de significado como a pílula de Emília. Por outro lado, é perfeitamente possível acelerar a consolidação das memórias através da otimização de variáveis fisiológicas naturalmente envolvidas no processo. Uma linha de pesquisa importante diz respeito ao sono, que comprovadamente beneficia a consolidação de memórias. Um grupo de pesquisadores da Universidade de Lübeck, Alemanha, testou os efeitos mnemônicos da estimulação cerebral com ondas lentas (0,75 Hz) ou rápidas (5 Hz) aplicadas durante o sono por meio de um estimulador transcraniano magnético. Os resultados mostraram que a estimulação de baixa frequência (mas não a de alta) é suficiente para melhorar significativamente o aprendizado de diferentes tarefas em humanos (Marshall et al., Nature, 444: 610-613, 2006). Ao que parece, as oscilações lentas que caracterizam o sono sem sonhos são puro pó de pirlimpimpim.
Sidarta Ribeiro - Revista Mente e Cérebro
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