14 julho 2008

Concurso de Inteligência

Apesar de sua prodigiosa capacidade intelectual, o homem – que devasta o planeta em malefício próprio – dificilmente durará 400 milhões de anos como os tubarões
Mas, afinal, o que é a inteligência? Muita gente pensa que é aquilo que se mede num teste de quociente de inteligência (QI). A capacidade de encaixar blocos de madeira ou realizar operações lógicas indica adaptabilidade a problemas desse tipo. Muitos outros tipos de inteligência existem, e para eles o teste de QI não serve. Ser inteligente é encaixar bem com a realidade, dissipando pouca energia e promovendo acomodações quando necessário. Comportamentos essenciais são inatos e estão presentes em todos os animais, como a alimentação, a fuga de predadores e a procriação. Outros comportamentos são aprendidos ao longo da vida, configurando ajustes ao ambiente. No caso do ser humano, a inteligência se baseia num vasto repertório de comportamentos adquiridos, o que nos dá grande flexibilidade de interação com o mundo. Embora tenhamos robustos aparatos neurais para a percepção e ação, grande parte de nosso enorme cérebro é dedicada à estocagem de memórias, tanto de perceptos quanto de atos motores. O arranjo cerebral particular que permite a façanha da civilização humana parece ter evoluído nos últimos 2 milhões de anos, mas data de apenas 10 mil anos a explosão cultural que nos permitiu tomar o planeta de assalto.
Muito antes do advento de nossos ancestrais hominídeos, animais bem diferentes eram os mais inteligentes da praça. Antes mesmo da supremacia dos dinossauros, iniciou-se a duradoura linhagem dos elasmobrânquios, peixes cartilaginosos como os tubarões e as arraias. As evidências fósseis indicam que mudaram muito pouco nos últimos 30 milhões de anos. Singrando o oceano no topo da cadeia alimentar, os tubarões realizam com maestria, desde tempos imemoriais, os três comportamentos inatos essenciais: comer, fugir e procriar. Antropomorfizado por Hollywood, o formidável tubarão-branco (Carcharodon carcharias) se transformou num ardiloso vilão. Exageros à parte, muitos tubarões têm cérebro proporcionalmente grande para seu peso corporal, superando algumas aves e mamíferos. É um aparato neural de grande sofisticação, em boa parte dedicado à percepção química e elétrica dos arredores. Há também a robusta circuitaria motora, capaz de comandar corpanzis de até 12 metros com a agilidade de torpedos teleguiados. Cérebros que não guardam muitas memórias, mas interagem com o ambiente há 400 milhões de anos com prodigiosa eficiência. Em time que está ganhando a evolução não mexe. E no entanto, muitas espécies de águas rasas estão desaparecendo, pois não há leis internacionais que impeçam a pesca em grande escala dos elasmobrânquios. Especialistas da União Internacional para Conservação da Natureza (IUCN) reportaram recentemente que 11 de 21 espécies estudadas estão vulneráveis à extinção. O recém-chegado primata bípede, com polegar opositor e cérebro descomunal, aprecia cação frito, moqueca de arraia e sopa de barbatana de tubarão. A inteligência do bicho homem, que devasta o planeta em malefício próprio, dificilmente durará 400 milhões de anos.
Sidarta Ribeiro - Revista Mente e Cérebro

2 comentários:

Heduan disse...

O que será inteligência? hhmmm Pois é... alguns como um tal de Timothy Leary acham que a inteligência pode ser desenvolvida descontroladamente por meios naturais e por isso mesmo a prefere.

Outros preferem também desenvolver a inteligência através de meios naturais mais ordenados, opostos aos meios naturais que defendem os primeiros.

Enquanto o jogo de preferencias rola, o desequilíbrio natural dos ecossistemas só aumenta. Provocado unicamente por estes mesmos que não sabem pelo que decidir.

Já os demais seres vivos, que não tem potencial de escolha e nem manifestações de inteligência descontrolada produzidos por fatores naturais, jamais produziram danos ao meio ambiente.

Por este raciocínio temos uma questão aqui de entendimento. Enquanto se entende que tudo o que vem da natureza, da terra, etc., pode ser consumido de forma livre sem implicações a saúde particular e ao meio ambiente como um todo, o desequilíbrio irá continuar.

Entendimento é compreensão.
Compreensão é subjetiva.
Desequilíbrios naturais e descontroles psíquicos são fatos.

Apenas a maturidade (que ainda não existe) do homo sapiens sapiens poderá encontrar um consenso. Mas a maturidade evolui aos poucos... aos poucos a cada milhão de anos.

Nasser de Melo disse...

Grande Heduan,
como você bem sabe, permita-me discordar...
Existem várias formas de se ampliar a consciência (inteligência): de maneiras ordenadas - cuidadosamente estudadas e praticadas; ou desordenadas - mais instintivas e somente práticas.
Apesar de serem bem diferentes, muitas vezes com posturas totalmente conflitantes, ambas indicam um caminho, que vai à mesma direção. Podem ser vistas como caminhos paralelos, que nunca se cruzarão, mas que seguem ao mesmo norte, a consciência. Quem trilha por qualquer desses caminhos, conscientemente, sempre evita provocar desequilíbrios, pois ambos buscam a integração com seu maio, mas da maneira que suas buscas lhes ensinam.
Penso que aqueles que "não têm potencial de escolha" – a maioria – trazem muitos danos, porque não possuem a percepção do prejuízo que sua forma de vida (individualista) produz.
Nosso grande problema são aqueles que querem manter essa maioria sob controle. Fazem isso através da elevação da futilidade e da superficialidade.
O desequilíbrio não é causado pelo conflito de caminhos entre aqueles que vão em busca da consciência. O conflito é entre os que querem manter a sociedade sobre as rédeas controláveis da inconsciência e aqueles que buscam a consciência e tentam semear essa busca entre todos os demais.
Foque sua energia para vencer aqueles que seguem a direção inversa a sua. São eles que causam os maiores danos.
Abraço